domingo, 18 de julho de 2010

A Coca Azul de Parintins


Antes de começar a ler, sugiro que você olhe para uma lata de Coca Cola comum. Ela é vermelhíssima no mundo inteiro... menos em Parintins, cidade do interior do Amazonas. Lá, ela é azul como o céu em dia de festa.

“Hein?” Dirá você. “Impossível! A identidade da Coca Cola é ser vermelha, uai!”

E eu te digo: ora, é possível e real. É que estamos no Brasil, terra onde dá de tudo. Em Parintins existe a tradicional e fortíssima Festa do Boi Bumbá, que divide a cidade em dois blocos de torcidas: os amantes do Boi Garantido (mais povão e mais garra) só vivem sob o azul do céu, porque Deus é a única coisa que está acima do Boi. Mas o céu ideal para eles seria vermelho.

Já a galera do Boi Caprichoso (mais elite, por assim dizer) só aceita ter sangue vermelho correndo nas veias porque os “do lado de lá” tem que agüentar o céu azul. Até porque os amantes do Boi Caprichoso queriam mesmo é ter o sangue azul, de verdade.

Parintins é única. Ou se é Garantido e vermelho ou Caprichoso e azul. Não há meio-termo, não há um ponto de interseção.

Agora, imaginem o que seria da Coca Cola se ela se conformasse em vender apenas 50% do refrigerante possível em Parintins. Para a empresa, isso não significaria quase nada mesmo. Parintins é do tamanho de uma cuia e está encravada no meio da floresta. O faturamento da Coca Cola no mundo não ia sofrer nenhum abalo. Mas...

Parintins ficou maior que muitos Carnavais. Maior que muitas cidades. Maior que muitas estratégias de marketing. Portanto, não vender Coca Cola aos amantes do Boi Caprichoso iria abalar a imagem da Coca Cola no Brasil. E isso poderia ser um rastilho de pólvora suficiente para abalar a Coca Cola no mundo. Daí...

Um salto para João Monlevade, a Parintins das Alterosas. Aqui, ou se é Garantido ou se é Caprichoso, também. Ou se é vermelho ou se é azul. Não há diálogo possível, ou pelo menos parece não haver nenhum diálogo possível.

Enquanto a Parintins original promove um verdadeiro espetáculo de arte e cultura popular, João Monlevade promove um espetáculo digno de vergonha. Como na Parintins original, os desligados do vermelho e do azul existem, mas são vistos como um extraterrestre qualquer.

Mas, ao contrário da Parintins original, Monlevade está vendo surgir um terceiro Boi. Um Boi verde, que ainda não tem nome, ainda não tem galera, ainda não tem tradição.

Por ser muito jovem, está abrindo seus espaços no que sobra do embate entre os gigantes. E acaba adotando atitudes que rivalizam com o Garantido vermelho e com o Caprichoso azul de nossas montanhas. É um amadurecimento forçado, que vai causar muitas feridas e muitas cicatrizes. Não há coesão entre o Diretor do Boi e o “carnavalesco” (porque não sei se caberia um “bumbaboiresco” ou coisa que o valha).

Quando acontecer a perfeita afinação entre estes dois, o espetáculo de João Monlevade pode melhorar e muito. Haverá mais opções de arte e cultura popular, e talvez os vermelhos e azuis forçados sintam-se mais leves a compor a galera verde.

Claro, sempre respeitando a todos que não querem seguir boi nenhum. Respeito à diversidade é coisa de gente educada e evoluída, e espero que Monlevade possa entender isso definitivamente.

Aqui dá de tudo, como em Parintins. Mas, aqui, a Coca Cola ainda não viu a necessidade de mudar a cor da lata. Tomara que não precise nunca, porque João Monlevade não pode ter o mesmo tamanho de Parintins, encravada na floresta como um ovo de beija-flor.

E viva o Boi Verde!!! Eu ousaria chamá-lo de Esperança.

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