Eu nunca consegui ver outra coisa no vocábulo "órfão" que não fosse uma beleza triste. E marcante também, daquele tipo de beleza que, uma vez vista com o olhar, liga-se instantaneamente à visão da alma. Um órfão está fisicamente só, neste mundo. Espiritualmente ele ainda está conectado ao coração dos pais que se foram para outro plano, mas quem diz que esta ligação espiritual nos ajuda a manter nossos filhotes na rédea?
Sou absolutamente órfão, desde 1998. E sou órfão de exemplos de vida e de formação do caráter, da lapidação da honra, de construção da virtude e da forja de guerreiros que preciso aplicar a meus filhos. Como ser pai, se não conheço exemplos que não sejam de outros filhos a dividir o mundo com os seus?
Como me apresentar aos meus "meninos" com elegância e eficiência, sem teatralizar uma pessoa completa que eu, sabidamente, não sou? Faltam-me alguns pedaços, é certo, que deveriam ter sido construídos pelo Sebastião Pais de Lima. "Vou improvisando como posso, vou vivendo como sou" - faltando peças - e vou torcendo para que meus filhotes sejam apaixonados por quebra-cabeças. Da vontade dos dois de somar alguns pedacinhos aos que eles já vêem em mim, poderá surgir um homem que seja Pai com P maiúsculo.
É meu sonho. O que tenho a meu favor é que órfãos costumam possuir uma tenacidade feroz. Sabendo que boa parte da caminhada terá que ser feita a braços e pernas próprios, um órfão se desdobra em quantos fragmentos forem necessários. Em quantas ferramentas forem necessárias.
O que nos move? Saber que existem outros tipos de orfandade, muito mais humilhantes que os nossos. Não temos os nossos pais e mães, é verdade. Mas não ficamos órfãos de seus valores.
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